Resenha do Filme: Poder além da vida


Resenha de Tiago Lacerda

O filme é baseado em fatos reais e pode ser considerado um material semiautobiográfico de Dan Millman, autor do livro intitulado O caminho do Guerreiro pacífico (Way of the peaceful warrior). A partir deste livro foi criado o filme Poder além da vida sob a direção de Victor Salva. O Filme é classificado como drama e foi lançado nos Estados Unidos no ano de 2006. O protagonista desta trama é o próprio Dan Millman interpretado pelo ator Scott Mechlowicz que é um ginasta muito entusiasmado pelo que faz e desejoso em participar das olimpíadas. Nada lhe falta: dinheiro, mulheres, faculdade, amigos e muitos troféus, mas mesmo tendo tudo isso um caos atravessa a sua vida, um caos no sentido de que as coisas se tornam desordenadas para uma hora se organizar. É preciso compreender que a vida é formada por essas forças antagônicas e que elas lutam dentro de nós para nos revelar quem somos.
O filme apresentou algumas regras sobre a vida que se apresenta sob os conceitos de paradoxo (a vida é um mistério, não desperdice seu tempo tentando compreendê-la), humor (mantenha seu senso de humor, principalmente em relação a você mesmo, é a força além de todas as medidas) e mudança (nada permanece imutável). Quem levou Millman nesta caminhada de descoberta foi Sócrates, que foi o eixo principal de suas novas descobertas, esse personagem é interpretado pelo ator Nick Nolte. Em meio a essa amizade aparece uma linda jovem chamada Joy (Amy Smart) que ajudará o ginasta a prosseguir sua trajetória em busca do conhecimento de si mesmo, das vitórias e do grande ideal que começara a almejar: ser um guerreiro de verdade, ou como explicita no livro de Dan Willman: um guerreiro pacífico.
O filme pode ser interpretado por diversos vieses. Citarei algumas cenas específicas para apresentar uma forma peculiar de assistir ao filme. Podemos começar numas das primeiras cenas do filme quando o jovem num diálogo com Sócrates escuta a primeira indagação: “você é feliz?”. A pergunta veio porque o jovem se ostentava em saber responder qualquer coisa. Nada lhe faltava, assim esta pergunta chega como um terremoto que estremece as bases psicológicas de uma pessoa segura de si. A primeira resposta partindo de Millman não poderia ser diferente: “o que felicidade tem a ver com isso?”, pois para uma pessoa materialista como ele o mais importante na vida é o que se pode conseguir com seu dinheiro: bens, títulos, mulheres etc.
No momento dessa pergunta partindo do pressuposto de que Sócrates é apenas uma idealização de seus desejos faz que o jovem atleta pense um pouco em tudo o que está fazendo. Será que vale a pena todo esforço se perdermos a nós mesmos? Buscamos conhecer o mundo e todas as coisas e nos esquecemos de quem somos e do que somos realmente capazes. Muitas vezes nos colocamos diante de nós mesmos e tememos ver e conhecer essa pessoa que se apresenta a nós. Pensamos ser mais forte que somos, mais inteligente que apresentamos, enquanto no fundo olhamos apenas para o nosso próprio ideal. Sócrates no filme representa a figura de um filósofo grego, um homem maduro que sabe tomar as decisões e que tem consciência de que “sabe que não sabe nada”, ou seja, pode aprender muito com as outras pessoas e retirar o conhecimento de dentro de cada delas.
Antes da cena do assalto, Millman se questionava sobre os valores que tinha. Sobre o que é certo e errado e percebeu que há uma convenção sobre o que é certo: em relação aos outros, ao que sabemos ou viver como vivemos. Aprendeu que não existe certo e que nunca vai estar certo ou mais errado que os outros. Que é preciso ter consciência de suas escolhas. Pois “todas as ações têm suas satisfações e seu preço, reconhecendo os dois lados o mundo se torna mais realista e responsável por suas ações”. Após essa reflexão ele sai do lugar em que estava e é assaltado, num primeiro momento ele pensa em revidar, no filme, ele diz isso para Sócrates: “uma pequena vantagem na hora e no lugar certo”, pois Sócrates poderia acabar com eles. Na verdade quem poderia acabar com eles era o ego de Millman que se achava forte o bastante para iniciar um duelo, mas ao perceber uma arma apontada em sua cabeça, a situação muda. No filme Sócrates joga a carteira, nesse momento é Millman, sua parte madura e racional que age, não reagindo. Esse é um dos ensinamentos do filme, ser um guerreiro pacífico, ou seja, você pode ganhar a guerra de uma forma inteligente.

O filme se desenvolve com inúmeros ensinamentos nesse sentido. Um dos precípuos é que pensamos que nossa alegria se encontra no destino que traçamos, mas nos enganamos. Pois é na jornada que a felicidade se desenvolve. Nossa vida precisa ser vivida intensamente no presente, não em desejos futuros ou recordações do passado. Assim o filme mostra que é possível atingir nossas metas quando colocamos o coração no aqui e agora, lugar fértil onde se pode cultivar uma história de autoconhecimento.

(Resenha publicada no TG-DOXA no dia 03/06/2013)
Tiago Lacerda

Professor no Departamento de Ciências Humanas e Sociais - UTFPR - Campus de Londrina. Professor do Quadro Próprio de Magistério da SEED-PR. Mestre e doutor em Filosofia pela PUCPR.

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